Marco Antônio de Morais Alcantara
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Caracterização geral do meio físico
Sistemas de
escoamento superficial e redes de drenagem
A conformação do terreno pode implicar
na existência de caminhos preferenciais de drenagem. Um sistema bastante
simples pode ser compreendido como um curso d’água e um conjunto de vertentes
laterais. como se observa da Figura 1, as variáveis para tal sistema poderiam ser, por exemplo, a vazão
transportada, a declividade da vertente, e a carga de detritos transportada
pelo curso d’água.
Figura 1: Elementos
de uma vertente
Este sistema pode estar em
equilíbrio com o regime de precipitação, e com a presença de vegetação nas
encostas.
Em outra situação, se poderia imaginar
um tipo de superfície onde linhas preferenciais atuariam como divisores de
águas, direcionando-as para as respectivas vertentes. Estes são os espigões. No conjunto global pode-se pensar
em uma hierarquia fluvial, e em uma bacia de drenagem, conforme a Figura 2 havendo cursos d’água
principais e tributários. Toda água desta região deve ser escoada por este
sistema.
Figura 2: Bacia
de drenagem e cursos d’água
Alguns aspectos devem ser
ressaltados com relação aos respectivos sistemas, como:
- O equilíbrio entre as variáveis.
Estes sistemas são o resultado de processos morfogenéticos atuantes durante
muitos anos, e, quando diante de intervenções, estes procuram partir para
outras configurações, muitas vezes desfavoráveis.
Por exemplo, diante do aumento da
quantidade de material sólido lançado em um curso d’água, este tende a diminuir
a sua capacidade de transporte, e provocar assoreamentos, e, por consequência,
enchentes, para permitir que o curso d’água se readapte para as novas condições
impostas para poder transportar a mesma vazão.
Cunha (2007) considera a
competência de um curso d’água em transportar sedimentos, distinguindo-se a
dimensão máxima das partículas e a quantidade, ainda, uma velocidade requerida
para o transporte de uma determinada partícula, havendo uma velocidade crítica
para o transporte de uma partícula, abaixo da qual esta vem a sedimentar-se.
O que poderia causar o aumento da
carga de detritos é o do desmatamento nas vertentes. O processo de erosão pode carrear
mais detritos para o curso d’água, assim como, proporcionar a aumento na
variação da declividade da vertente.
Dentre os cursos d’água distingue-se os
retilíneos, os anomostosados, e os meandrantes. De acordo com Cunha (2007) os
retilíneos de modo geral de longa extensão são mais raros de acontecer na
natureza, sendo decorrentes de eventos geológicos. Os canais retilíneos são
resultado de condições de homogeneidade nas condições de atuação da água e da
ação de trabalho do rio, já os meandrantes buscam equilíbrio entre as condições
de declividade, vazão, condições do entorno, como a vegetação, e transporte da
carga sólida. Os rios anomostosados são os que não apresentam canais bem
definidos.
Quanto
à sua largura, esta pode ser maior, no período das cheias, ou, menor, no
período da estiagem, denominadas de leito maior e de leito menor, podendo haver
ainda o leito maior excepcional, nas épocas de grandes cheias.
Um curso d’água pode ser
alimentado pelo lençol freático no período das cheias, ou alimentar o lençol no
período da estiagem. A Figura 3 apresenta a ilustração de um rio retilíneo,
meandrante, e das condições da largura do rio conforme as estações.
Figura 3: cursos d'água (a) retilíneo; (b) meandrante; e (c) níveis d'água conforme estações
Formas
que a água pode se encontrar no terreno e atuação no meio físico
A literatura clássica apresenta o
lençol freático, o qual tem ideia intuitiva conforme Rodrigues (1977), onde,
supondo a existência de uma massa de areia úmida sobre uma placa impermeável,
esta tenderá a se exsudar pelas extremidades da areia sobre a placa, e a região
saturada tenderá a se limitar abaixo da linha indicada por N.F; esta linha
representa a cota a partir da qual a água presente no material poderá alimentar
um poço então escavado. A placa impermeável representa o substrato rochoso que
de modo geral limita a presença da água para as regiões mais profundas, salvo
quando esta tem acesso pelas fendas e, esta vem a alimentar os aquíferos
confinados. conforme a Figura 4, a linha N.F tende a acompanhar a curvatura do material, assim como
o N.F tende a acompanhar o perfil do terreno.
Figura 4:
Variação do lençol freático com relação à topografia
Quando se analisa o perfil de um
terreno, observa-se que este pode apresentar as seguintes regiões com relação a
forma em que a água se encontra disponibilizada:
- Zona não-saturada. Nesta região a
água está associada ao solo por fenômenos físico-químicos, não saturando os
vazios do terreno. Está sujeita à pressão neutra negativa. A água nestas condições
pode ser retirada do terreno pelas raízes das plantas, quando estas são
alimentadas.
- Franja capilar. Nesta região, a
concentração da água é maior do que no caso anterior, mas os vazios do solo
ainda não estão saturados. A água está acessível através da ascensão capilar,
pelos canais capilares que são formados no terreno através da conexão de
vazios. A franja capilar permite a presença da vegetação nas encostas.
- Lençol freático. Nesta região os
vazios dos solos estão saturados, e a água está sob o regime hidráulico dos
solos saturados, e estão ainda sob a influência da pressão neutra
positiva.
A Figura 5 apresenta uma
ilustração do perfil do terreno, da disponibilidade de água, e da vegetação.
Figura 5: Nível
d’água, lençol freático e franja capilar
A dinâmica
do meio físico
Fatores
intervenientes na dinâmica do meio físico
Um dos ciclos mais importantes
conhecidos da natureza é o ciclo hidrológico. Este tem como protagonista
principal a água, nas suas diversas formas, e tem também a participação de
outros personagens como, a vegetação, o terreno, as rochas, e outros.
Tomando-se como ponto de partida
a água na forma de precipitação, têm-se que, esta pode ser interceptada
parcialmente pela vegetação, através de suas folhas e copas, assim como, outra
parte pode ser infiltrada pelo terreno, sendo, esta parcela dependente da estrutura
do solo e da permeabilidade do terreno, e influenciada ainda pela declividade
da área, pela presença de raízes, e de folhas depositadas no chão. Finalmente,
outra parcela é direcionada para o escoamento superficial.
Quando se fala em infiltração se
considera também a “estocagem da água no solo”, esta tem por fim satisfazer a
demanda de água pelo terreno, podendo levar à saturação do mesmo, quando a
partir de então o escoamento superficial é compreendido como o excedente. Além
do escoamento superficial existe o escoamento sub-superficial, o qual tende a
alimentar os cursos d’água. A Figura 6 ilustra todo o processo. O ciclo da água é fechado com a
evaporação dos cursos d’água em regime livre, e pela evapo-transpiração, pela
vegetação.
Figura 6: Ciclo
de passagem da água pelo meio físico
As ações dinâmicas citadas podem
contribuir para a ocorrência dos fenômenos de erosão, transporte, sedimentação
e assoreamento no meio físico. Diante de tudo isto se deve considerar também a
intensidade da precipitação, fatos marcantes em eventos do meio físico com conseqüências
para o meio urbano.
Alguns aspectos do
escoamento superficial e do escoamento sub-superficial
O escoamento superficial tem como motor
a gravidade, é bastante rápido, e tem duração intimamente relacionada com a
duração da precipitação, sobretudo quanto aos máximos de intensidade. Ele é o
responsável pelo rápido aumento da vazão nas enxurradas. Já o escoamento sub-superficial
tem como motor o gradiente hidráulico dos solos, é lento, podendo ter um tempo
de permanência muito maior no lençol freático. O escoamento subsuperficial ocorre segundo gradiente hidráulico no solo, mediante linhas de fluxo, onde a carga é consumida ao longo do escoamento (Figura 7). Pode ter atuação mesmo após o
término da precipitação, com conseqüências perceptíveis para o meio físico,
como a alimentação do lençol e dos córregos por períodos mais duradouros.
A erosão regressiva é resultante
do processo de carreamento de partículas do solo em decorrência das forças de
percolação, e que coloca em risco a estabilidade das paredes de escavações, de
taludes, e de obras de terra. A erosão regressiva é conhecida também como
fenômeno de entubamento, ou piping (Figura 7).
A formação de tubos e vazios contribui para o colapso de estruturas de terra.
De acordo com Thornes (1980) é preciso haver um forte gradiente hidráulico de modo a se desencadear um processo de erosão regressiva, e, o fenômeno pode ser influenciado pela variação de textura, da permeabilidade e da facilidade de dissolução dos solos.
Figura 7: Linha de fluxo, superfícies equipotenciais, e talude
A formação de tubos e vazios contribui para o colapso de estruturas de terra.
De acordo com Thornes (1980) é preciso haver um forte gradiente hidráulico de modo a se desencadear um processo de erosão regressiva, e, o fenômeno pode ser influenciado pela variação de textura, da permeabilidade e da facilidade de dissolução dos solos.
Modificações
graduais na conformação do meio físico
Dentre os fenômenos graduais que
pode ocorrer no meio físico existe a da erosão hídrica. Conforme DAEE (1989), o
escoamento superficial pode provocar processos erosivos nos terrenos, conforme
a duração e a intensidade da precipitação, e, sobretudo, do tipo de solo, da declividade,
e das condições de exposição da vertente. O processo pode apresentar etapas,
como ilustra a Figura 8:
- Erosão concentrada em
micro-depressões;
- desenvolvimento vertical com a
formação de canal em forma de “V”;
- alargamento das paredes laterais;
- formação de vales com o recuo das
encostas;
- formação de novos canais tributários.
Figura 8: Erosão
superficial e ravinamento
Quanto ao escoamento
sub-superficial, e da influência das forças de percolação, segundo DAEE (1989)
pode-se desenvolver o processo de erosão regressiva, com possíveis ruínas e
desbarrancamentos (Figura 9), com possível formação de um novo vale remontando em direção a
montante da encosta.
Por meio deste processo pode ser
esculpida a paisagem do meio físico.
Outro fenômeno curioso, abordado
em Coelho neto (2007), é o que acontece em fundo de vales. Considerando-se o
teor de umidade no interior do terreno, pode-se levar em consideração a sua
variação em função da distância do nível freático, e da distancia da borda do
canal.
Inicialmente, pode-se imaginar um
momento antes do início da precipitação; neste caso, a região próxima à borda,
e ao nível freático apresenta condições de saturação, vindo o teor de umidade a
diminuir com a distância do nível freático e da borda do canal (Figura 10). Após
o início da precipitação têm-se as contribuições tanto do escoamento
superficial como do sub-superficial, o nível do córrego se eleva, e o teor de
umidade no terreno no perfil da encosta sofre modificações, com a profundidade
e gradativamente com a borda do canal (Figura 10).
Em se continuando a precipitação
a região adjacente à borda do canal alcança completo nível de saturação, e, em
face do gradiente hidráulico, é movimentado o escoamento sub-superficial da
encosta para o terreno e ao curso d’água. Este pode contribuir para a
ocorrência de fenômenos erosivos nas margens.
Figura 10: Variação das condições de umidade e fluxo em um barranco conforme a variação da precipitação. Antes da precipitação (a), após o início (b), após alguns dias (c)
Bibliografia
COELHO
NETTO, A.L. Hidrologia na encosta na interface com a geomorfologia. Geomorfologia uma atualização de bases e
conceitos, Rio de Janeiro, 2007, Bertrand Brasil, pp.93-148
CUNHA,
S.B Geomorfologia fluvial. Geomorfologia
uma atualização de bases e conceitos, Rio de Janeiro, 2007, Bertrand
Brasil, pp.211-252
DAEE – Departamento de águas e energia elétrica,
Secretaria de águas e saneamento, Governo do Estado de São Paulo. Controle de erosão. São Paulo, 1989,
92p.
RODRIGUES, J.C. Geologia para engenheiros civis. 1977,
São Paulo, Mc Graw Hill, 208p.
THORNES, J.B Erosional processes of running water and
their spatial temporal controls: a teorical viewpoint. In: Soil erosion. 1980,
M.J.Kirkby e R.P.C. Morgan, pp.129-182
Sobre o autor:Marco Antônio de Morais Alcantara é Engenheiro Civil formado pela Universidade Federal de São Carlos-BR, com ênfase em Engenharia Urbana (1986); Mestre em Engenharia Civil, área de concentração em Geotecnia, pela Universidade Federal de Viçosa-BR (1995); Master Génie Civil, Matériaux et Structures, pelo Institut National des Sciences Appliquées de Toulouse-FR (2001); Docteur Génie Civil, Matériaux et Structures, pelo Institut National des Sciences Appliquées de Toulouse-FR (2004); e tem pós-doutorado em Estruturas pela Universidade do Porto-PT (2012). É docente da FEIS/UNESP desde 1987.
Sobre o autor:Marco Antônio de Morais Alcantara é Engenheiro Civil formado pela Universidade Federal de São Carlos-BR, com ênfase em Engenharia Urbana (1986); Mestre em Engenharia Civil, área de concentração em Geotecnia, pela Universidade Federal de Viçosa-BR (1995); Master Génie Civil, Matériaux et Structures, pelo Institut National des Sciences Appliquées de Toulouse-FR (2001); Docteur Génie Civil, Matériaux et Structures, pelo Institut National des Sciences Appliquées de Toulouse-FR (2004); e tem pós-doutorado em Estruturas pela Universidade do Porto-PT (2012). É docente da FEIS/UNESP desde 1987.