quinta-feira, 10 de setembro de 2015

A POPULAÇÃO, A CONSTRUÇÃO, E A APROPRIAÇÃO DO ESPAÇO CONSTRUÍDO


Marco Antônio de Morais Alcantara

#ApropriaçãoDoEspaço #UtilizaçãoDoEspaçoConstruído


Este texto tem por fim discutir o papel das populações sobre a maneira de intervir no espaço urbano, assim como, destas compreenderem as propostas que lhe são implantadas. Alguns princípios tendem a ser universais, e consagrados, como as formas de se intervir na sociedade, e de construir. Todavia, as populações têm um papel ativo muito importante neste processo de apropriação do ambiente construído, refletindo, algumas vezes, qual é a sua maneira de ocupar e de intervir no espaço, dentro de um papel característico, conforme o seu contexto de vida e de relação com a sociedade e do entorno. 

A construção do ambiente construído


Rodrigues (1984), chama atenção para as pessoas que tem a mesma visão da vida, diferenciando grupos de pessoas que terão a mesma maneira de reagir, e conferir a atribuição de valores às coisas.

Fadigas (2010) considera que as cidades são o resultado da evolução social e cultural das pessoas, e que, ao longo do tempo lhes moldaram as tipologias, os modelos, e o funcionamento, mantendo, conforme o autor, em muitos casos, as malhas urbanas de épocas anteriores, e a continuidade cultural e espacial, de sucessivas gerações de habitantes e de suas atividades.  Considera o autor que a sua evolução no tempo é um processo dinâmico e interativo, semelhante ao dos processos naturais; as paisagens resultantes são, por isso, marcadas pela ação do homem e pela reação do meio.

Deste modo, a urbanização espelha, nas formas que assume, e nos ritmos que faz, um processo histórico traduzido em diferentes formas, tomadas as  relações entre as comunidades humanas e o meio onde vivem, assim como, a maneira pela qual dele se apropriam. Conclui então o autor, que a transformação territorial associada a este fenômeno, resulta na criação de habitats diferenciados quanto à forma, a densidade de ocupação, a intensidade do uso do solo, e dos recursos naturais, implicando na organização de redes de suporte ao seu funcionamento, e à sua sustentabilidade.

Lynch(2011) considera que a imagem de uma cidade é importante para o usuário, de modo que este possa interagir com ela, dentro de uma ideia de relações de sobrevivência. Isto, sem dúvida, influencia na maneira pela qual o indivíduo pode conceber o espaço construído, e identificar uma relação com este espaço. 

Desenvolvimento sustentável


De acordo com Amado (2009), a utilização alargada do conceito “desenvolvimento sustentável” se deu a partir de duas conferências da ONU, sobre ambiente e o desenvolvimento, nas quais foi reconhecida a necessidade de estratégias a serem adotadas, em face do crescente índice de urbanização, e dos riscos de desertificação de algumas áreas. De modo geral são sustentáveis:

-O que vai ao encontro de necessidades de gerações presentes, sem comprometer a capacidade de desenvolvimento próprio das gerações futuras.

-Pode ser visto como conjunto de programas de desenvolvimento, que vão ao encontro dos objetivos e satisfação das necessidades humanas, sem violar a capacidade de regeneração dos recursos naturais, a longo prazo, nem os padrões de qualidade ambiental e de equidade social.

-Deve reconhecer fatores sociais e ecológicos, assim como fatores econômicos, da base de recursos vivos e não vivos, e das vantagens e desvantagens das ações alternativas, tanto a curto como a longo prazo.

-É compreendido como uma forma de mudança social, que se acrescenta aos tradicionais objetivos de desenvolvimento, o objetivo de sustentabilidade ecológica.

A apropriação do espaço construído


O urbanismo ocidental tem sido em grande parte influenciado pelas ideias propostas por Le Corbusier, as quais valorizam espaços individuais privados, e espaços de uso compartilhado, como parques, espaços de vivência e recreação, e áreas de serviços condominiais. Neste sentido, o perfil do usuário passa a receber grande importância, de modo a se evitar disfunções urbanas na fase de pós-ocupação em loteamentos. 

De acordo com Lacaze(1995), importa que o usuário adote como é o seu  espaço planejado. Como exemplo, o autor aponta para os casos dos modelos construídos segundo Le Corbusier, o qual foi bom para as cidades de Marselha e de Rezé, sendo o mesmo rejeitado em Briey e em Fiminy. Não depende somente da natureza do modelo, mas também da maneira como os ocupantes o fazem seu.

Considera então o autor que, estes exemplos, contém ensinamentos importantes que devem ter em mente quando se tem por objetivos intervir no meio urbano. Primeiro: o processo de apropriação pelos moradores constitui um processo decisivo. Quando existe a apropriação do espaço, a população estabelece relações com aquele espaço, no sentido de incorpora-lo para o seu espaço de vivência, e de suas atividades importantes, para o cotidiano.

Ressalta o autor que a apropriação do espaço não pode ser feita “por decreto”, mas depende da interação da população com aquele espaço, e esta nele intervir. Finalmente, quem pode garantir o sucesso de um empreendimento não é, na verdade, um crítico de passagem, ainda que especialista, mas o utilizador, o qual poderá validar.


Bibliografia


AMADO, M.P. Planejamento urbano sustentável. Casal de Cambra-Pt, Caledoscópio, 2009, 254 p.

FADIGAS, L. Urbanismo e natureza-os desafios. Lisboa, Edições Sílabo, 2010, 1149 p.

LACAZE, J.P.  A cidade e o urbanismo.  Lisboa, Piaget, 1995, 141p.

LE CORBOUSIER. Planejamento Urbano. São Paulo, 1971, Perspectiva, 203 p.

LYNCH, K. A imagem da cidade. Lisboa, 2011, Edições 70, 198 p.

RODRIGUES, F.M. Desenho urbano, cabeça, campo e prancheta. São Paulo, 1986, 116 p.


Sobre o autor:Marco Antônio de Morais Alcantara é Engenheiro Civil formado pela Universidade Federal de São Carlos-BR, com ênfase em Engenharia Urbana (1986); Mestre em Engenharia Civil, área de concentração em Geotecnia, pela Universidade Federal de Viçosa-BR (1995); Master Génie Civil, Matériaux et Structures, pelo Institut National des Sciences Appliquées de Toulouse-FR (2001); Docteur Génie Civil, Matériaux et Structures, pelo Institut National des Sciences Appliquées de Toulouse-FR (2004);  e tem pós-doutorado em Estruturas pela Universidade do Porto-PT (2012). É docente da FEIS/UNESP desde 1987.