sábado, 21 de julho de 2018

A PROBLEMÁTICA DA EXECUÇÃO DE OBRAS URBANAS: CONFORMAÇÃO DA ÁREA E A INFRAESTRUTURA





Marco Antônio de Morais Alcantara

#InfraestruturaUrbana #MeioFísico #MorfologiaDoMeioFísico #DrenagemUrbana

A conformação do terreno, sistemas viário e edificações

Quando se pensa na construção urbana um aspecto de grande importância é o da forma da superfície do terreno. Esta pode nos comunicar coisas importantes a serem consideradas tanto quando na fase de construção como na da pós-ocupação. Na fase da construção, por exemplo, pode-se levar em consideração, os movimentos necessários de terra para chegar à topografia desejada, os bota-foras para os descartes, assim como os cortes de desbastes de terreno necessários para a instalação das futuras construções, e, os acessos das edificações às redes públicas.

Ainda na fase de construção, pode-se considerar a posição do lençol freático, e a possibilidade de que ele seja interceptado, trazendo transtornos para as escavações.


A Figura 1 apresenta o contexto do lençol freático em meio às construções urbanas.

Figura 1: Contexto do lençol freático em meio às construções urbanas


Quanto à fase do pós-ocupação, pode-se tomar em consideração como aspectos importantes as condições favoráveis para as condições de drenagem na área, não havendo possíveis concentrações de águas. Também são considerados importantes à acessibilidade da área e o consumo de combustível, e a velocidade de escoamento das águas de efluentes em sistemas de esgoto sanitário.

Um outro aspecto importante na forma da superfície pode ser a climatização da área. A liberdade para os ventos, a canalização das águas, a condição de incidência dos raios solares, podem esta relacionadas à forma da superfície dos terrenos (Figura 2).


Figura 2: Tipos de terreno ou elementos da topografia e a influência sobre a climatização, como no caso de terreno plano (a), e colinas (b) 


Situação de drenagem com relação ao desenho urbano e a conformação do meio físico

Consideremos o caso particular de um divisor de águas. Este é representado pelo espigão, onde o escoamento das águas é favorecido, e as águas tendem a não ficar concentradas no pavimento (Figura 3a). Uma outra situação é aquela que é dada quando se tem uma rua acompanhando a curva de nível (Figura 3b). Neste caso, deverá se encontrar condições adversas para o escoamento das águas pluviais, tendendo estas a ficar concentradas na via. Este desenho ainda implica que, por outro lado, quanto à via que está posicionada de modo ortogonal às curvas de nível, em uma vertente, tem-se que, esta pode apresentar declividade acentuada, resultando em maiores velocidades para o escoamento das águas, e trazendo como consequências a erosão do solo ou de pavimento, conforme às tolerâncias dadas pelas velocidades limites (Figura 3b). A Figura 3c apresenta um caso intermediário, onde as vias ortogonais tem oportunidade de escoamento das águas pluviais.


Figura 3: Posição das vias com relação às curvas de nível


Um outro caso que deve ser ressaltado é o de uma linha de drenagem natural no terreno. Esta é caracterizada por uma região onde devido à sua conformação o escoamento se dará de modo concentrado (Figura 4). Normalmente esta região é dotada de vegetação, à qual é protetora da encosta. Recomenda-se que estas áreas sejam resguardadas de modo a se evitar possíveis problemas erosivos.


Figura 4: Caso de drenagem natural do terreno


A problemática da evacuação das águas do meio urbano

Isto é um caso particular de interação entre os sistemas de infraestrutura urbana e o terreno. Já é conhecido que no meio urbano tende a ser favorecido o escoamento superficial. A disposição dos sistemas pode ser importante quando a disposição do núcleo urbano pode induzir a um gradiente de energia potencial, o qual é gasto quando no lançamento das águas no meio físico. Esta dissipação de energia pode se dar de modo danoso ao meio físico, com o desencadeamento de processos erosivos. Cabe ressaltar que os emissários de sistemas de águas pluviais conduzem grande vazão, resultante do recolhimento de bacias representativas de grandes áreas em uma cidade (Figura 5).


Figura 5: Escoamento de águas pluviais


Como solução para o problema tem-se os dissipadores de energia nos locais de lançamento, de modo que esta energia cinética não seja dissipada no meio físico.

Um outro caso é o dos fundos de vales. Para o caso de fundo de vales se colocam duas alternativas, envolvendo a retificação de córregos:

-Retificação do rio e a sua canalização, com a ocupação das áreas inundáveis pelo sistema viário (Figura 6a).

-Retificação ao mínimo do rio, e deixar o espaço inundável preservado (Figura 6b).

A primeira solução contribui, sem dúvidas conforme o que já foi apresentado, para a inundação, face ao aumento da vazão, e a necessidade de redimensionamento do canal. Para o segundo caso, além de mais segurança, oferece a opção de se utilizar o espaço inundável para paisagismo.


Figura 6: Opções para o caso de fundo de vales: a) canalização b) respeitando o curso d’água original e permitindo as variações sazonais  


Um segundo caso é com relação á variação do nível dos cursos d’água. O rio periodicamente se enche, precisando de um espaço livre para a sua inundação. Somado a isto, a impermeabilização da área contribui para o aumento da vazão dos cursos d’água, e para a ocorrência de enchentes (Figura 7).


Figura 7: Níveis de um rio nas fases de período seco e de cheias, e os riscos de inundação. a) período seco, b) período de cheias


Também pode pensar no caso de soluções mais ecológicas para os loteamentos, reduzindo-se os desmatamentos e as áreas pavimentadas, bem como, a utilização de parcelamento do solo e do uso e ocupação do solo mais favoráveis à infiltração da água nos terrenos.

Desassoreamento e retificação de córregos

O desassoreamento assume geralmente um papel de socorro e de correção no sentido de se proporcionar o escoamento das águas, e de se evitar enchentes. A canalização de córregos muitas vezes é vista como a solução definitiva para determinada área de uma cidade. Normalmente acontece em decorrência de um histórico de enchentes em determinada área, e envolve financiamentos públicos junto a determinados órgãos específicos para desenvolvimento urbano. Cabe considerar que a canalização em si não pode obrigatoriamente resolver os problemas de determinada área.

Vejamos o histórico de um bairro, conforme ilustração descrita em Botelho (1985), conforme ilustram as Figuras 8 e 9:


Figura 8: Um breve histórico de ocupação, intervenção e evolução do meio físico em um determinado bairro. 
Figura 9: Um breve histórico de ocupação, intervenção e evolução do meio físico em um determinado bairro (Continuação).


Por este exemplo se pode observar que os problemas de escoamento de águas e enchentes devem ser vistos de modo global, e não de modo isolado, ou somente quando as disfunções se manifestam. O assunto é tema do planejamento e do gerenciamento urbano, e, quanto maior é a evolução do problema, maiores são os custos de solução, e a eficácia pode ter duração limitada. 

Neste sentido, considerando o aspecto de interdependência, se os subsistemas fluviais estão interligados, os eventos também o podem estar; assim, o aumento da vazão proporcionada pela presença do loteamento "C", na Figura 10, poderá ser percebido para quem está na sessão de controle “S”, assim como, um assoreamento à jusante, devido ás ações no loteamento “B” pode provocar um efeito remontante, em se considerando que o escoamento seja subcrítico, pois o escoamento subcrítico é controlado à jusante, de modo que, muitas vezes um problema urbano não pode ser obrigatoriamente resolvido procurando-se sanar o problema no próprio local, mas, a solução deve ter ação global, mais ampla.



Figura 10: A interdependência entre partes diferentes da cidade para com o problema de enchentes

A geomorfologia e as intervenções nos cursos d’água

As intervenções antrópicas sobre os cursos d’água visam de modo geral, segundo Cunha (2007):

-Efetuar o controle sobre a vazão;
-atenuar os efeitos de enchentes;
-extrair cascalhos.

Como ações normalmente efetuadas pode-se citar a alteração da forma da calha, com o alargamento da seção e o aumento da profundidade, a mudança do material de revestimento, e a retificação.

Algumas observações podem ser consideradas conforme o relato, como:

-Os efeitos colaterais da dragagem pode ocorrer em face do rebaixamento do nível de base do canal, induzindo a processos erosivos nos afluentes tributários, e posterior assoreamento;
-no caso da retificação de um curso d’água, com a eliminação de meandros, aumenta o gradiente hidráulico devido ao menor comprimento, induzindo ao processo erosivo à jusante. 


Bibliografia citada no texto:

BOTELHO, M.H.C. Águas de chuva engenharia de águas pluviais nas cidades. São Paulo, Edgard Blücher, 1985, 236p.

CUNHA, S.B Geomorfologia fluvial. Geomorfologia uma atualização de bases e conceitos, Rio de Janeiro, 2007, Bertrand Brasil, pp.211-252