sábado, 14 de abril de 2018

URBANIZAÇÃO DE FAVELAS, CONTEXTO TÉCNICO E HUMANO




Marco Antônio de Morais Alcantara

#UrbanizaçãoDeFavelas

Quando se fala em urbanizar favelas muitas vezes se depara como imagem o ambiente construído; mas não podem ser negligenciados: o ser humano, o alvo principal de intervenção, a sociedade e o meio físico. Estes elementos são de difícil separação de modo que uns interferem em outros de maneira dinâmica.

Um processo de ocupação espontânea por população de baixa renda se dá preferencialmente em locais que não possuam valor comercial para a exploração através de loteamentos, em áreas impróprias para a ocupação, ou até mesmo em áreas restritas à ocupação.

Neste contexto a condição física dos locais se enquadra como nos casos de regiões de elevada declividade, ou em vales sujeitos a inundações, e como consequência dos atributos físicos são sujeitos à ocorrência de desmoronamentos, escorregamentos, enchentes, e, ainda, estas populações ainda convivem com a presença do esgoto a céu aberto, e do acúmulo do lixo, prejudicando as condições sanitárias e polarizando os vetores transmissores de doenças. 

Das ações realizadas sobre o meio físico para a ocupação vem inicialmente o desmatamento, favorecendo a erosão superficial, ou a infiltração d’água no terreno, implicando na perda de estabilidade deste diante da ação da erosão superficial ou sub-superficial. Convém ressaltar que muitos dos locais estão em depressões que recebem o fluxo dos emissários de escoamento da drenagem urbana, agravando as condições de lançamento, sem se ter realizado as devidas precauções.

Da erosão e do transporte de sedimentos, além do lixo gerado, vem o assoreamento do curso d’água acentuando as enchentes; da ausência ou insuficiência da água tratada, da convivência com o lixo e do contato com o esgoto acentuam-se as condições de saúde do indivíduo.

No contexto social se podem destacar a exclusão, o preconceito, dificultados sobretudo pela falta de inserção no tecido urbano por não ter endereço, ou o vínculo com um bairro. Caracteriza-se a falta de cidadania.

A dificuldade de acesso físico contribui para agravar mais ainda a situação para o caso da entrada de serviços.

Do ponto de vista jurídico, as favelas ou ocupações espontâneas são compreendidas como “cidade ilegal”, visto que as habitações e os arruamentos não atendem aos protocolos estabelecidos pelos códigos de obra locais.

Atentando-se para a questão do direito social, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, conforme a sua emenda de 2010, conforme o seu artigo 6º assevera que todo cidadão tem direito a:  educação; saúde; alimentação; trabalho; moradia; transporte; lazer; segurança; previdência social; proteção à maternidade ou à infância; e assistência enquanto desamparado.

O atendimento a esses direitos pode estar vinculado à condição de instalação de uma população.

Um programa de melhoria das condições de instalação de uma população estaria então amparado e justificado nada menos do que pela constituição federal.

Dentro de uma experiência acadêmica junto à Universidade Federal de São Carlos em 1985, durante a disciplina final “Projeto de Infraestrutura Urbana 1”, e dentro desse tipo de atuação, posso dizer que a experiência foi bastante gratificante, pela possibilidade de dar esperanças à uma população. Uma população marcada pela agressão gratuita do meio físico, pela diferenciação com relação à população do bairro vizinho, pela exclusão, pelo desprezo (quando muitas vezes o lixo vizinho era descartado lá) e pela baixa autoestima.

Como obras prioritárias dentro de um programa de intervenção cita-se a canalização de rios e córregos, assim como o disciplinamento das águas pluviais nas vias internas, com a construção de guias, sarjetas e galerias; nos casos de regiões de declividade acentuada se requer a construção de acessórios para diminuir a energia da água no escoamento. Em vias próximas ou adjacente se requer a diminuição da velocidade na área, de modo a oferecer segurança aos moradores que transitam por ali; considerando o hábito de se andar a pé, passarelas sobre córregos também se tornam importantes, para dar segurança e acessibilidade. Obras de contenção de taludes e de proteção de encostas também se tornam necessárias para evitar acidentes urbanos, além da construção de obras para a integração social e parques.

Um projeto de urbanização de favela envolve o ambiente construído e a parte humana, como apresentado no início. Não dá para intervir à toque de caixa, ou remover e estocar a população em outra área, salvo que aquela área seja uma área de risco. A população precisa participar do projeto; deve-se tomar em conta o “modus vivendi” do usuário, e toda infraestrutura projetada tem que ser incorporada e apropriada pela população. Na verdade, é um projeto multidisciplinar, envolvendo engenheiros, arquitetos, sociólogos, geólogos, educadores e outros.
 
 Muitas vezes a população tem o receio de deixar o local por questões de segurança à sua sobrevivência, e acredito que até na maioria das vezes ela prefere melhorar o local do que partir para uma nova área. A solução para o parcelamento do solo deve então ser resolvida. Neste sentido vem à tona os códigos para projetos de loteamentos e de habitações que atendam a essa condição específica, por exemplo com relação ao tamanho mínimo dos lotes, e à largura das vias.