Marco Antônio de Morais Alcantara
#UrbanizaçãoDeFavelas
Quando se fala em urbanizar favelas muitas vezes se depara como imagem o ambiente construído; mas não podem ser negligenciados: o ser humano, o alvo principal de intervenção, a sociedade e o meio físico. Estes elementos são de difícil separação de modo que uns interferem em outros de maneira dinâmica.
Um processo de ocupação
espontânea por população de baixa renda se dá preferencialmente em locais que
não possuam valor comercial para a exploração através de loteamentos, em áreas
impróprias para a ocupação, ou até mesmo em áreas restritas à ocupação.
Neste contexto a condição física
dos locais se enquadra como nos casos de regiões de elevada declividade, ou em
vales sujeitos a inundações, e como consequência dos atributos físicos são
sujeitos à ocorrência de desmoronamentos, escorregamentos, enchentes, e, ainda,
estas populações ainda convivem com a presença do esgoto a céu aberto, e do
acúmulo do lixo, prejudicando as condições sanitárias e polarizando os vetores
transmissores de doenças.
Das ações realizadas sobre o meio
físico para a ocupação vem inicialmente o desmatamento, favorecendo a erosão
superficial, ou a infiltração d’água no terreno, implicando na perda de
estabilidade deste diante da ação da erosão superficial ou sub-superficial.
Convém ressaltar que muitos dos locais estão em depressões que recebem o fluxo
dos emissários de escoamento da drenagem urbana, agravando as condições de
lançamento, sem se ter realizado as devidas precauções.
Da erosão e do transporte de
sedimentos, além do lixo gerado, vem o assoreamento do curso d’água acentuando
as enchentes; da ausência ou insuficiência da água tratada, da convivência com
o lixo e do contato com o esgoto acentuam-se as condições de saúde do
indivíduo.
No contexto social se podem
destacar a exclusão, o preconceito, dificultados sobretudo pela falta de
inserção no tecido urbano por não ter endereço, ou o vínculo com um bairro. Caracteriza-se
a falta de cidadania.
A dificuldade de acesso físico
contribui para agravar mais ainda a situação para o caso da entrada de
serviços.
Do ponto de vista jurídico, as
favelas ou ocupações espontâneas são compreendidas como “cidade ilegal”, visto
que as habitações e os arruamentos não atendem aos protocolos estabelecidos
pelos códigos de obra locais.
Atentando-se para a questão do
direito social, a Constituição da República Federativa do Brasil de 1988,
conforme a sua emenda de 2010, conforme o seu artigo 6º assevera que todo
cidadão tem direito a: educação; saúde;
alimentação; trabalho; moradia; transporte; lazer; segurança; previdência
social; proteção à maternidade ou à infância; e assistência enquanto
desamparado.
O atendimento a esses direitos
pode estar vinculado à condição de instalação de uma população.
Um programa de melhoria das
condições de instalação de uma população estaria então amparado e justificado
nada menos do que pela constituição federal.
Dentro de uma experiência
acadêmica junto à Universidade Federal de São Carlos em 1985, durante a
disciplina final “Projeto de Infraestrutura Urbana 1”, e dentro desse tipo de
atuação, posso dizer que a experiência foi bastante gratificante, pela
possibilidade de dar esperanças à uma população. Uma população marcada pela
agressão gratuita do meio físico, pela diferenciação com relação à população do
bairro vizinho, pela exclusão, pelo desprezo (quando muitas vezes o lixo
vizinho era descartado lá) e pela baixa autoestima.
Como obras prioritárias dentro de
um programa de intervenção cita-se a canalização de rios e córregos, assim como
o disciplinamento das águas pluviais nas vias internas, com a construção de
guias, sarjetas e galerias; nos casos de regiões de declividade acentuada se
requer a construção de acessórios para diminuir a energia da água no
escoamento. Em vias próximas ou adjacente se requer a diminuição da velocidade
na área, de modo a oferecer segurança aos moradores que transitam por ali;
considerando o hábito de se andar a pé, passarelas sobre córregos também se
tornam importantes, para dar segurança e acessibilidade. Obras de contenção de
taludes e de proteção de encostas também se tornam necessárias para evitar acidentes
urbanos, além da construção de obras para a integração social e parques.
Um projeto de urbanização de
favela envolve o ambiente construído e a parte humana, como apresentado no
início. Não dá para intervir à toque de caixa, ou remover e estocar a população
em outra área, salvo que aquela área seja uma área de risco. A população
precisa participar do projeto; deve-se tomar em conta o “modus vivendi” do
usuário, e toda infraestrutura projetada tem que ser incorporada e apropriada
pela população. Na verdade, é um projeto multidisciplinar, envolvendo
engenheiros, arquitetos, sociólogos, geólogos, educadores e outros.
Muitas vezes a população tem o receio de
deixar o local por questões de segurança à sua sobrevivência, e acredito que
até na maioria das vezes ela prefere melhorar o local do que partir para uma
nova área. A solução para o parcelamento do solo deve então ser resolvida.
Neste sentido vem à tona os códigos para projetos de loteamentos e de
habitações que atendam a essa condição específica, por exemplo com relação ao
tamanho mínimo dos lotes, e à largura das vias.