Marco Antônio de Morais Alcantara
#EstabilizaçãoQuímicaDeSolos #Aditivos
A estabilização de solos é uma prática bastante adotada na execução de obras de infraestrutura urbana, tais como nos casos da construção de bases para pavimentos, reforço de subleito e a construção de aterros. Os processos de estabilização são diversos, assim como, as finalidades que se tem em uma estabilização. Dentre os tipos para as obras de pavimentação, por exemplo, pode-se citar a estabilização granulométrica, com a incorporação de materiais granulares ao solo criando-se uma mescla, e a posterior compactação (estabilização mecânica), e ainda, pode se referir à estabilização química. Esta última se caracteriza pela incorporação de aditivos químicos aos solos, ou de adições minerais ativas, que atuam por meio da formação de produtos cimentantes.
Dentro deste contexto, alguns aspectos
podem chamar atenção.
A execução dos serviços de
compactação de solos é realizada sempre com base nos parâmetros de compactação
de solos, a saber, a umidade ótima de moldagem e a massa específica seca
alcançada dentro da energia de compactação aplicada (Figura 1). Este é o caso da estabilização mecânica
Figura 1: Curva de compactação de solos
Quando uma compactação é realizada abaixo
da umidade ótima ela consiste na formação de um material dotado de vazios, e
sujeito a ser permeável, enquanto que, em se trabalhando com o teor de umidade
acima do teor ótimo pode-se induzir o material à fissuração interna.
As propriedades do solo em
compactação podem variar conforme o tipo de solo, em termos
de: granulometria, microestrutura interna e organização, susceptibilidade à deformação, de modo a poder
permitir a máxima redução do volume de vazios do solo. Estas são as condições naturais que podem influenciar na compactação.
Por outro lado, existem os aspectos de agregação dos solos. No caso da estabilização mecânica falamos em modificações á curto prazo.
Neste sentido, os parâmetros geotécnicos do solo podem podem sofrer a influência dos aditivos químicos e das adições minerais. Em alguns casos, a presença do
aditivo no solo pode implicar em modificações, tanto no valor da umidade ótima
de moldagem, como no valor alcançado da massa específica seca do solo. É o caso da
cal, por exemplo (Figura 2).
Figura 2: Alterações na curva de compactação de solos pela influência de aditivos (cal)
Esta influência pode se dar pela interferência causada pela presença do aditivo na chamada “dupla camada difusa”, a qual reflete a presença de uma concentração iônica em torno das partículas do solo, neutralizando as cargas de superfície.
A “espessura” desta dupla camada, composta por uma "nuvem de íons", permite definir o comportamento do solo quanto ao seu estado de agregação;
sendo este de dispersão ou de floculação. Isto modifica as propriedades reológica
dos solos. A floculação pode fazer com que a energia requerida para a
deformação do solo, imposta pela compactação, seja maior, e a dispersão tende a facilitar o trabalho de
compactação. Os íons monovalentes, tais como o sódio ou o potássio, contribuem para a
dispersão das partículas, em razão do aumento da espessura da camada difusa, enquanto que os íons bivalentes, tais como o cálcio e o magnésio, tendem a favorecer a floculação dos solos, visto que eles vão neutralizar melhor as cargas de superfície das partículas do solo, e fazer diminuir a espessura da dupla camada.
Do aumento da espessura da dupla camada do solo vem a repulsão entre as partículas, promovendo a dispersão, e da diminuição da espessura, vem as chances de aproximação e da floculação mediante a contribuição de outras forças.
A presença da cal em solos
contribui para o aumento da umidade ótima de compactação, em face da floculação, e diminuição da massa
específica aparente. A cal também contribui para a redução do índice de
plasticidade dos solos (IP), facilitando os trabalhos de compactação em casos
de solos de elevado IP.
Alguns aditivos são diluídos em água e, nesses casos, se deve levar isto em consideração, quando no cálculo da água de umidificação.
A resistência apresentada pelo
solo é normalmente avaliada pelo Índice de Suporte Califórnia (ISC), o qual é expresso em
porcentagem de resistência do solo com relação a que é apresentada por um solo padrão. Pode-se comparar os valores
para este índice, tomando por base o solo de referência, e o solo aditivado.
Diante dos estudos, pode-se ainda
realizar trechos experimentais, com a extração de testemunhos, e a avaliação do
grau de compactação alcançado dentro da sistemática de execução adotada.
Agora, falando das modificações à longo prazo, causadas exclusivamente pela estabilização química.
Se por um lado, quanto à parte da estabilização mecânica, a eficácia da estabilização pode depender das características físicas, da microestrutura, e do comportamento fisico-químico do solo, quando se trata de estabilização química, não se deve ignorar também a
natureza do solo, de modo a se poder inferir ou avaliar a eficácia da
estabilização. Os estabilizantes químicos possuem mecanismos específicos, e
estes jogam com as características dos solos, tais como: a composição química e mineralógica, a granulometria, o pH, além dos fatores externos, como a
temperatura. Este desempenho pode ser corroborado pela evolução do comportamento mecânico, nas idades prescritas de cura, à longo prazo.
O cimento Portland é um aditivo do tipo aglomerante, e deve atuar por meio da hidratação e da aglomeração das
partículas do solo. Ele atua de modo independente. Outros aditivos funcionam pela interação destes com os solos. É preciso haver a contrapartida das duas partes, o aditivo e o solo, para a formação de produtos cimentantes. Um aditivo de atuação por ataque alcalino, por exemplo, atua pela sua
interferência sobre a estabilidade química de minerais do solo, sob pH alcalino, condicionando a solubilização e a disponibilização destas na solução do solo, as quais poderão então, ser recombinadas com substâncias ou elementos do
aditivo, com a formação de materiais cimentantes. Diferentes aditivos poderão
explorar diferentes aspectos da composição do solo.
Para se ilustrar a existência de diferentes mecanismos, um exemplo pode ser apresentado com base em três tipos de solos de Ilha Solteira-SP. Estes
solos são citados aqui pelos seus apelidos no antigo laboratório da CESP e no atual laboratório da UNESP, em Ilha solteira-SP: Torre de transmissão (TT), Linha de Transmissão (LT)
e Rotatória (R). Os nomes estão associados aos seus locais de coleta, e estes
solos são classificados de acordo com a classificação pedológica como “Argissolo, Latossolo Vermelho Amarelo,
e Latossolo Vermelho Escuro respectivamente.
A análise química destes solos é
apresentada a seguir, na Tabela 1
Tabela 1: Análise química dos solos da região de Ilha Solteira-SP utilizados no estudo
Matéria
orgânica
|
Acidez
potencial
(H+Al)
|
Alumínio
|
Óxidos de Ferro
|
Saturação
de bases
|
pH
|
|
g/dm3
|
mmol/dm3
|
mmol/dm3
|
mg/dm3
|
%
|
pH
|
|
L.T
|
2
|
16
|
1
|
3
|
13
|
4,7
|
T.T
|
1
|
18
|
6
|
2
|
8
|
4,4
|
R
|
18
|
38
|
14
|
11
|
7
|
4,3
|
Foram comparados os
desempenhos destes solos a partir das seguintes condições: (i) estabilizados
com 8% de cal, (ii) estabilizados com 1, 2 e 3(%) de Hidróxido de sódio (com
adição de soda cáustica diluída), e (iii) com a associação dos dois tipos de
estabilizantes conjuntamente.
Para o caso da estabilização com cal, a Figura 3 apresenta os
resultados para o caso de estabilização com cal, no teor de 8% com relação à massa seca do solo, referente aos solos TT, LT e R, e considerando as idades de cura
dadas por 90, 180, 360 e 545 dias.
Figura 3: Desempenho dos solos com a utilização da cal, para diversos períodos de cura
Com base nos valores de
resistência mecânica apresentados para o uso da cal como estabilizante, observa-se que o desempenho inferior foi
atribuído ao solo R. É curioso que, este fosse o solo que apresentava o maior teor de argila, o que
seria bom para o caso da cal pela presença de minerais de neo-formação, mais reativos, este solo também apresentava o maior teor de
óxidos de ferro e de matéria orgânica, os quais são considerados como inibidores das reações solo-cal (ALCANTARA, 1995). Os solos que apresentaram o melhor
desempenho com a cal, como os solos TT e LT, exibiam menores teores de óxidos de
ferro, alumínio e de matéria orgânica.
Agora, analisando os casos de estabilização com o hidróxido de sódio.
A Figura 4 apresenta os casos de estabilização com o hidróxido de sódio para os solos representados, TT, LT e R, para 90 dias de cura. É feita a comparação em função do tipo de solo.
Figura 4: Desempenho dos solos com o hidróxido de sódio para 90 dias de cura
Agora, se considera cada tipo de solo e a evolução em função do teor do aditivo e do tempo de cura.
As Figuras 5, 6 e 7 apresentam os
casos da estabilização com o hidróxido de sódio (1, 2 e 3%) para as respectivas
idades de cura, e solos TT, LT e R.
Figura 5: Desempenho do solo TT com o hidróxido de sódio para diversos períodos de cura
Figura 6: Desempenho do solo LT com o hidróxido de sódio para diversos períodos de cura
Figura 7: Desempenho do solo R com o hidróxido de sódio para diversos períodos de cura
Quando se observa os mesmos tipos
de solo, quando estabilizados com o hidróxido de sódio, por meio da soda
cáustica, verifica-se que: (i) os valores máximos alcançados com o hidróxido de
sódio são menores do que os alcançados com o hidróxido de cálcio (cal hidratada), assim como, os
teores do hidróxido sódio utilizado também são menores; (ii) os solos TT e LT apresentaram a tendência
de que os valores da resistência mecânica são crescentes com o teor do aditivo; (iii) o solo R, que havia
apresentado o desempenho inferior com o hidróxido de cálcio, com o hidróxido de sódio, ele já apresentou um desempenho relativamente elevado para o menor teor do aditivo, dado por 1(%), mas vindo o desempenho a
piorar com o aumento do aditivo.
Fica então evidente que, determinados tipos de solo podem ter associações particulares para com os diferentes tipos de aditivos, e que, os teores adotados para um determinado tipo de aditivo, e para um determinado tipo de solo, podem ser de modo crescente, alcançando cada vez mais um maior desempenho, ou, também, pode-se considerar que o aumento deste aditivo pode se extrapolar para além de um teor ótimo, a partir do qual poderão haver outros efeitos
colaterais.
Para os casos dos solos T.T e L.T houve um indicativo de que o crescimento da resistência mecânica é favorável segundo o aumento do hidróxido de sódio, dentro dos teores adotados. Já no caso do hidróxido de sódio, e para o solo R, suspeitou-se que houve a formação de produtos
de natureza diferente daquela cimentante, em especial com a interação do excesso de aditivo e a matéria
orgânica.
Quanto à
diferença de comportamento dos solos frente aos diferentes aos dois tipos de aditivos,
observa-se que, para os casos dos solos TT e LT, a composição dos solos
contribuiu para melhor permitir o desenvolvimento das reações pozolânicas, isto é, do
hidróxido de cálcio com os argilo-minerais do solo. Já para o caso do solo R,
verifica-se pela sua composição química que este apresenta o maior teor de alumínio em composição; se por um lado este apresentou um desempenho comparativo inferior quando com o hidróxido de cálcio, por outro, ele veio aparentemente a
se manifestar um outro tipo de desenvolvimento por processo químico.
Ingles e
Metcalf (1973) apresentam os resultados de uma experiência realizada com solos
lateríticos da Índia, com a adição de 10% de hidróxido de sódio com relação ao
peso seco do solo. Para esta experiência, o valor da resistência mecânica, medida por meio de
ensaio de compressão simples, apresentou ganhos com relação ao tempo, de até 80
kg/cm2 após 80 dias de cura. Conforme os autores, o aditivo apresenta
reação favorável nos solos ricos em caulinita e alumínio, e fraco desempenho
nos solos ricos em montmorilonita, e que são os casos do solo de Ilha Solteira.
Um dos mecanismos de estabilização citado pelos autores consiste na degradação da estrutura
do argilo-mineral pelo ataque alcalino, resultando como produtos de degradação
o silicato de sódio e o aluminato de sódio. Os últimos se precipitam com a
formação de óxidos hidratados de alumínio, que preenchem poros e promovem
cimentação, com aumento da massa específica aparente.
Agora, o caso da atuação conjunta.
A Figura 8 apresenta os resultados para os casos de utilização conjunta dos dois tipos de
estabilizante, hidróxido de cálcio e hidróxido de sódio, dentro das proporções apresentadas . Considerando um possível efeito de sinergia entre os dois tipos
de estabilizantes, observa-se que o solo LT foi o que melhor apresentou este efeito,
e em especial quando é considerado o incremento do hidróxido de sódio.
Figura 8: Desempenho dos solos com o hidróxido de sódio+cal para 90 dias de cura
Fazendo um balanço,
observa-se que, dentre os seguintes casos o melhor estabilizante foi o
seguinte: (i) cal (hidróxido de cálcio), para o solo TT; (ii) hidróxido de sódio, para o
solo R; (iii) associação dos aditivos, para o solo LT.
Desta forma, fica evidente que a as características dos solos e dos aditivos são importantes para
um bom desempenho, quando adotado um determinado tipo de aditivo químico, assim como, um
suporte laboratorial é importante, de modo a se identificar os teores de
tolerância, de benefícios, de modo a se evitar o consumo
desnecessário, ou os efeitos colaterais devidos ao excesso. E até mesmo se o aditivo é aquel compatível com o tipo de solo.
Bibliografia
ALCÂNTARA, M.A.M. Estabilização química de solos para fins rodoviários: Técnicas
disponíveis e estudo de caso dirigido à estabilização solo-cal de três solos de
Ilha Solteira-SP. Viçosa, UFV, 1995, 91p. Tese (Mestrado)-Universidade
Federal de Viçosa, 1995.
INGLES, O.G. & METCALF, J.B. Soil stabilization principles and
practice. New York, E.U.A, Swikey e Sans, 1973, 374 p.